Projeto De Lei Quer Punir A “Cura” Gay
- Lisandro Aqueronte
- 27 de nov. de 2023
- 5 min de leitura
Atualizado: 16 de mai. de 2024
O deputado Guilherme Cortez, representante do Psol-SP, apresentou um projeto de lei ,PL 1495/2023, que visa punir as terapias de reorientação sexual, popularmente conhecidas como “cura” gay. E mais do que certo, já está na hora de pôr um fim nesta longa história de violência!

Sumário
A “cura” gay é um velho fantasma que assombra a comunidade a muito tempo deixando uma trilha de corpos por onde quer que passe. Quero neste espaço não só resgatar esse triste passado como mostrar que as terapias de reorientação sexual não funcionam e são danosas ao indivíduo. E digo mais: apesar da propaganda de muitas igrejas a “cura” para a homossexualidade simplesmente não existe. Você deve está se perguntando: como você sabe disto? Ora, simples:
I. A Humanidade Já Tentou Curar A Homossexualidade
“Se um homossexual quer deixá-lo de sê-lo, ele tem todo o direito de querer. E ele tem todo o direito de pedir ajuda médica, ajuda psicóloga, ajuda psiquiatra, ajuda psicológica, ajuda que ele quiser.”
— Pastor Yago Martins
Por anos a homossexualidade foi considerada uma doença (até 1990 ainda estava na lista de patologia da OMS) e por anos tentaram encontrar a “cura”. Nesta busca centenas de pessoas foram expostas a psicoterapias individuais; coletivas; tratamento eletroconvulsivo; indução de náusea e vômito; hipinose e até mesmo reorientação de orgasmos. Todas essas técnicas não só mostraram serem ineficientes como apresentaram efeitos colaterais indesejáveis como depressão profunda; disfunções sociais e tentativas suicidas. Ou seja, as evidências apontam não só ao fracasso das terapias como ao perigo que elas escondem. Por isso é mais do que sensata a resolução 001/99 do Conselho Federal de Psicologia:
“Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.”
Como pode vê, que direito um homossexual tem ao clamar pela “cura” gay? Direito a uma prática que não funciona? Ser submetido a um “tratamento” que pode custar a sua vida? Veja bem, estamos falando de pacientes fragilizados psicologicamente e que não possuem o conhecimento de como essas “terapias” podem ser devastadoras. Todos os LGBTQIA+ tem direito de pedir ajuda médica, psicológica, psiquiátrica, mas essa ajuda não está numa cura que não existe.
Também é importante ressaltar que o passado está ai para ser estudado e uma revisão sistemática realizada por alunos e professores da The Ohio State University, A systematic review of the research base on sexual reorientation therapies, em 2008 concluiu mais uma vez a ineficiência da “cura” gay além de apontar:
I. Falta de fundamentos teóricos;
II. Falhas metodológicas;
III. Violação de princípios éticos e direitos humanos.
A humanidade já tentou por diversas vezes curar a homossexualidade e tudo o que conseguiu foi…
II. Uma Era de Repressão
“Eu de fato perdi contato comigo mesmo durante todos aqueles anos porque estava muito ocupado tentando ser outra pessoa.”
— Garrard Conley
A “cura” gay não é possível, porém é possível que uma pessoa reprima sua sexualidade, isso implica sentir desejo e negar para si mesmo o direito de realizá-los, enquanto o mundo se entrega a satisfação dos mesmos, seja pelo sexo ou está ao lado da pessoa amada, andar de mãos dadas, abraço acalorados ou aquele beijo tímido na pracinha.
Isso tudo é uma tortura e ao longo prazo terá um alto preço a se pagar. Permita-me te convidar a conhecer obras que expõe, feito uma supernova, o preço a se pagar:
II. I. Pray Away

Documentário de 2021 da Netflix, conta a história da “terapia de conversão”. Aborda o contexto histórico/politico. Expõe a hipocrisia da sociedade; o lado B da “cura” gay; a vida reprimida de seus ex-lideres, sobreviventes e ,claro, o como tudo explodiu em polêmicas.
II. II. Boy Erased: Uma Verdade Anulada

Essa é a autobiografia de um sobrevivente ,Garrard Conley, até então apresentei dados, mas aqui eles ganham vida e vemos o lado da vítima, vítima da sociedade, da homofobia estrutural.
Percebemos que há algo de muito errado com a nossa sociedade quando vemos um pai, que também é pastor, que ao descobrir que o filho foi estuprado, fica mais revoltado com a sexualidade dele do que com o crime. E ainda ameaça expulsá-lo de casa caso não buscasse uma forma de se livrar deste “espinho” na carne, a homossexualidade.
“Em algum momento, todos nós tínhamos ouvido um ‘mude isso ou então…’. Ou então ficaríamos sem casa, sem dinheiro, seríamos excomungados, exilados.”
Você consegue perceber a monstruosidade disto tudo? É uma leitura forte onde testemunhamos várias formas de morte, morte da identidade de um jovem, morte do relacionamento de pai e filho (a custo de quê?), morte até mesmo da própria fé do rapaz que não suportou a tortura psicológica.
“Como é não ter que pensar em todos os seus movimentos, não ser examinado por tudo o que você fez, não ter que mentir todos os dias?”
Se você tiver estômago e a cabeça no lugar recomendo a leitura, mas te aviso logo: esta obra é uma viagem ao inferno. Porém se quiser conhecer está história e não estiver a fim de mergulhar tão fundo como só a literatura pode fazer, então, recomendo o filme de 2018 estreado por Lucas Hedges, Nicole Kidman e Joel Edgerton.
O filme pode não ser tão devastador quanto o livro, mas ainda consegue transmitir uma história pertubadora e revoltante.
“Era nosso medo da vergonha, seguido pelo medo do Inferno, que realmente evitava que cometêssemos suicídio.”
III. E O Horror Continua
Infelizmente a questão da “cura” gay ainda não está resolvida no Brasil como aponta o relatório “Entre Curas e Terapias: esforços de correção da orientação sexual e identidade de gênero de pessoas LGBTI+ no Brasil” realizado pela All Out Brasil.
“Identificamos que o problema das ‘terapias de conversão’ no Brasil é muito maior do que imaginávamos, porque não acontece de forma isolada, de uma vez e em um lugar só. Estes esforços estão pulverizados em diversos setores da sociedade e, geralmente, envolvem muitas pessoas da comunidade da pessoa sobrevivente.”
— Lucas Bulgarelli, Diretor Executivo do Instituto Matizes
Mesmo com a “cura” gay sendo vetada pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) ela continue sendo praticada. “A pesquisa identificou 26 formatos de ‘curas’ e ‘terapias’ de reversão sexual e de gênero, as quais são praticadas ou iniciadas por lideranças religiosas, pediatras, psicólogos, coaches, filósofos clínicos, professores, diretores de escola, familiares e amigos.”
É revoltante, é algo que precisa ser dito e acima de tudo…
IV. A “Cura” Gay Tem Que Ser Criminalizada!!!

E finalmente chegamos a esse ponto, o projeto de lei do deputado Guilherme Cortez que visa punir quem pratica a “cura” gay e também propõe estabelecer o dia 26 de julho como o Dia Estadual de Conscientização e Combate a esse tipo de terapia.
Espero que ao longo desta jornada ter te conscientizado sobre a estupidez das terapias de reorientação sexual e dos severos danos psicológicos que podem causar ao indivíduo.
Em pleno século XXI com todo o nosso arcabouço científico ainda tenha gente defendendo esta loucura. Quem pratica tal abominação deve ser punido com o rigor da lei, chega de tanto sofrimento, chega de histórias tristes, chega desta chuva vermelha, diga não a “cura” gay!!!
Faço deste momento derradeiro as palavras do deputado Guilherme Cortez minhas:
“Nossas identidades não são doenças. Não vamos permitir que mais pessoas LGBTs sejam submetidas a esse tipo de tortura disfarçada de medicina. Não podemos permitir que o fundamentalismo faça mais vítimas”

Referências:
Notícia sobre o prejeto de lei: https://gay.blog.br/saude/projeto-de-lei-busca-punir-programas-de-cura-gay/
Preojeto de lei: https://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1000504820&tipo=1&ano=2023
Resolução 001/99 do conselho Federal de Psicologia: https://site.cfp.org.br/resolucao-01-99/o-que-e/
Pesquisa da "cura" gay no Brasil: https://institutomatizes.com.br/cura-gay-entenda-como-esforcos-de-correcao-sexual-e-de-genero-impactam-na-vida-de-pessoas-lgbti-no-brasil/
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